Por Liana Marzinotto


Fotos: Cristiano Bizzinotto


Nome artístico com sobrenome armênio, Eduardo Semerjian se tornou ator há exatos 30 anos. Dono de uma voz grave e marcante, possui peculiaridades distintas e interessantes, como uma alimentação saudável à base de alimentos orgânicos (em sua maioria). Entre risos, suco, chá e torradas no aconchegante Barroco esta entrevista foi feita. Um papo sobre cultura, família, carreira.

É apaixonado pelo Palmeiras, o que pode ser observados nas fotos que acompanham esta matéria.

Aprecia o rock internacional, mas é amante do rock brasileiro das décadas de 70 e 80 e de boas leituras.

Eduardo gosta de andar e explorar lugares desconhecidos e neste universo, convido você a fazer o mesmo.


Eduardo Lourenço Magdaleno, 56 anos, ator que se arrisca a dirigir e produzir peças tem no teatro a sua casa e na interpretação um ato para exercer a espiritualidade, de perceber "como posso ser outro (personagem) sendo eu mesmo". O estou fazendo aqui? Esta é a pergunta que ele sempre se faz e que como resposta acredita no propósito, caso contrário, "apenas estamos lá, um objeto andante vivendo de forma mecânica repetidas vezes".


Liana Marzinotto - Você disse que foi "quase" um monte de coisas. Quais coisas são estas?

Eduardo Semerjian - Quase fui goleiro profissional no futebol society, com possibilidades de ter jogado no Palmeiras e no Juventus. Quase fui médico, cheguei a entrar no curso de medicina na PUC de São Paulo. Comecei biologia e química e não conclui nenhuma delas. Até que minha tia sugeriu comércio exterior, pois meu tio tinha uma empresa de trading company e desta vez eu finalizei o curso, mas não exerci a profissão.


Liana Marzinotto - Depois de ter sido "quase" várias coisas, hoje você é ator. Como foi essa descoberta?

Eduardo Semerjian - Foi ao acaso! (risos). Eu estava reunido com um grupo de uns 15 amigos em um bar por ocasião da despedida de um deles, que iria se mudar para a Alemanha. Estávamos em uma mesa grande e perto de mim vi um folheto sobre curso de teatro. Me interessei pelo curso, fiz minha matrícula e comecei a fazer. Eu sempre soube que queria fazer algo relacionado ao corpo, à vida, só não sabia, até aquele momento, o que era. Este período era setembro de 1990.

Liana Marzinotto - E antes desse acaso, o que fazia? 

Eduardo Semerjian – Eu trabalhei em varejo na Sears e na Mesbla. E um dia, chegando bem cedo na loja, estava sozinho no salão de vendas, olhei para aquele mar de produtos, de bicicletas, TVs, geladeiras e me perguntei: O que eu estou fazendo aqui? Decidi me demitir e indo a caminho para a sala da gerência, encontrei com um vitrinista, um rapaz novo e nesse dia, ao passar por mim, ele me pegou pelo braço e disse: Em três meses sua vida vai mudar e, em agosto, eu me matriculei no curso de teatro, com 24 anos. Já fazem 30 anos que exerço a profissão de ator.


Liana Marzinotto - Qual foi seu primeiro trabalho? 

Eduardo Semerjian - A primeira vez que eu coloquei meus pés em um palco foi na peça "Um Meio em Três Quartos", em 3 de abril de 1992. Essa peça era uma compilação de três contos: um do romancista Rubem Fonseca, chamado "O Caso de FA"; um do japonês Ryo nosuke Akutagawa, chamado "No Bosque" e um conto do dramaturgo Luigi Pirandello, “A Luz da Outra Casa”. Éramos um dos núcleos do grupo de pesquisa de tea tro de São Paulo chamado o Boi Voador. Nossos ensaios duraram um ano e meio e a temporada da peça durou apenas quatro meses e acabou (risos).


Liana Marzinotto No seu extenso curriculo constam atuações em teatro, televisão e séries. Fale um pouco do seu trabalho.

Eduardo Semerjian - Por decisão pessoal, passei a déca da de 90 fazendo somente teatro minha predileção. Duas peças foram especiais: "Caros Ouvintes", escrita e dirigida por meu grande parceiro artístico Otávio Martins e "A Bala na Agulha", da mineira Nana de Castro, também dirigida pelo Otávio. Nesse período fiz alguns comerciais e um lon ga em 1994, chamado "16060" do Vinícius Mainardi, um dos primeiros filmes produzido pós Era Collor. A partir do ano 2000 comecei a fazer mais cinema. Atuei em "A Cegueira", "Minha Mãe é una peça-. "Meus Pais", um filme lindo, com Rodrigo Santoro. Dé bora Falabella e direção de André Ristum. Em 2005 fiz minha primeira participação em TV, com "Carandiru - Outras Histórias", uma série para a televisão do filme "Carandiru". Cada episódio contava a história de um personagem do filme, como é originalmente o livro. No ano de 2001, fiz "Nina" do Heitor Dhalia e em 2002 fiz "Olga" do Jayme Monjardim. Eu adoro também fazer série, no formato obra fechada. com roteiro completo, onde é possível desenvolver a trajetória do personagem ao longo dos episódios, como um quebra-cabeça. Há uma série que eu gostei muito de fazer! Foi a primeira série brasileira "O Negócio" (HBO), com quatro temporadas e eu participei de todas.


Liana Marzinotto - Podemos falar sobre sua vida pessoal? 

Eduardo Semerjian Bora! (risos). Nunca quis me casar, mas tenho uma filha, a Duda (Maria Eduarda) de 12 anos. Dizem que ela "é a minha cara" e da minha mãe e eu tenho "a cara" da minha mãe, logo... (risos). Tive uma irmá (falecida) do primeiro casamento do meu pai e um irmão do segundo casamento dele. Após ficar vi úvo, se casou com minha mãe e hoje somos três, eu, o Rafael e o Rodrigo. Meu pai faleceu em 1995 e minha mãe tem 80 anos e mora em São Paulo. Minha ligação com minha mãe é muito boa. Admiro a compreensão que ela tem sobre a vida. Minha mãe era lindíssima e na década de 60 ganhou alguns concursos de miss.


Liana Marzinotto - Como foi sua infancia e adolescência? 

Eduardo Semerjian - Era uma criança sensível e doce. mas que "aprontava pra caramba". Tinha gostos estra nhos e um deles era uma fixação por observar a explo são de ovos. Quem sofria eram nossos vizinhos da rua Augusta em São Paulo. Eu atraia alguns gatos com lin guiça e quando chegavam, eu jogava os ovos risos ora acertava, ora errava. O mesmo eu fazia tentando acertar os ovos entre os espaços da janela de vidro da nossa vizinha, dona Mercedes. Como adolescente era muito magro. cabeludo (risos e muito tímido. Minha timidez atrapalhava a relação com as garotas, pois tinha dificuldade em demostrar senti mentos. Tinha preguiça de estudar e ficava sempre de recuperação, era quando nas férias, eu estudava e con seguia boas notas para passar de ano (risos). Saía pou co para não gastar muito. Eu estudei em bons colexios como bolsista e esta situação me proporcionou uma ótima educação formal, mas socialmente, uma desvantagem. Meus melhores momentos eram jogando bola.


Liana Marzinotto - E hoje, como é o Eduardo adulto? 

Eduardo Semerjian - Quando tinha cinco anos, uma vez perguntei à minha mãe porque meus irmãos tinham personalidades marcantes, assertivas e eu não. Ela me deu a seguinte resposta: Eles não têm personalidades mais marcantes do que você, eles têm personalida des diferentes de você. Continuo sensível, mas é uma sensibilidade com maior maturidade de forma que crio minhas defesas, que não me deixa tão exposto e me permite maior discernimento. Depurei mi nha sensibilidade para ser quem sou hoje.